Eram cerca das 9 horas, quando chego ao Estabelecimento Prisional de Custóias, no Porto. Na qualidade de Advogado, 1ªvez, 1º contacto com um mundo oculto, o dos criminosos, dos bandidos, porque quem está na prisão teve que cometer algum crime, sujeito a pena de prisão, ou, preenchidos os pressupostos da prisão preventiva, aguarda julgamento.
Identifico-me, sou sujeito ao detector de metais, e, abre-se a porta para o mundo oculto, onde visualizo uma prisão com capacidade para aproximadamente 700 reclusos, albergar quase o dobro; onde existem apenas 200 guardas prisionais para uma imensidão de reclusos; um orçamento reduzido para metade em 2012; onde a droga circula como quem toma um café diário; as violações sexuais (afirmadas peremptoriamente pelos guardas prisionais) são frequentes e incontroláveis, devido ao facto de não existirem câmaras de vídeo-vigilância nas celas, com mais incidência nos reclusos mais novos; as rixas constantes, num ambiente degradante e abrupto, onde a luta pela sobrevivência é o retrato, num espírito de vale tudo.
Passar pelos corredores, pelas alas ( existem 4 pavilhões, de A , dos presos preventivos, ao D, dos restantes reclusos a cumprir pena), deve ser das imagens mais próximas das vistas por um filme retratando as prisões, onde a desgraça, o fim, o desespero, a angústia, a decadência, a perda de direitos tão fundamentais, de quem vive sem liberdade retrata os seus quotidianos.
Curioso verificar que dentro da prisão existe uma padaria (onde reclusos fabricam o próprio pão que consomem - cerca de 5000 pães diários), uma barbearia (com a tradicional fotografia com uma "mulher nua"), oficina de mecânica e carpintaria, uma horta, ginásio (na minha opinião, eu não concordo, porque não acho uma coisa indispensável, e, que permita a designada ressocialização, acho mesmo que tem o efeito contrário), uma capela, estúdio, um supermercado (cada recluso tem um cartão e é premiado pelos bons comportamentos, e , pelos bons comportamentos vai obtendo compensações económicas, que lhe permitem, comprar, por exemplo, tabaco ou outras coisas de supermercado).
O momento mais importante para o advogado é o contacto com o cliente, e, aí existe as salas para contacto. Curioso que quando se pergunta a um preso a razão de estar preso, ele responde: "culpa do advogado (e ainda têm a lata de dizer isto a outro Doutor, quando esquecem que um Advogado competente e diligente nunca diz mal de um colega de profissão, porque há deveres para ser cumpridos e devemos defender a classe, há deveres de urbanidade, probidade, lealdade e solidariedade para com os colegas de profissão)". Eles são todos bons rapazes! Partilho aqui um Julgamento que assiste de um homicído, onde uma das testemunhas dizia, acerca do arguido: " Ele é bom rapaz, mas quando não está bêbado". A bebida deve ter perdão, mas só se for no Código Deontológico dos alcoólicos anónimos, porque no Direito é para ser punida, e algumas testemunhas, quando prestam o juramento em tribunal, deviam saber que, no caso de faltarem à verdade, incorrem em responsabilidade criminal, e, mesmo assim, algumas mentem por todos os lados.
Por vezes, a posição do advogado é fácil de ser criticada, e, variados clientes querem apenas resultados, quando um advogado nunca pode comprometer-se com o resultado, apenas pode indicar cenários, estratégias e probabilidades, quem decide é o juíz.
Ainda na prisão, fala-se do recente suicídio de um jovem de 22 anos, ficando por justificar a razão de haver, cada vez mais, suicídios dentro dos estabelecimentos prisionais. As prisões não devem ser abandonadas, porque a falta de investimento nas mesmas e a falta de acompanhamento é um motivo de preocupação que deve ser estendido a todos os cidadãos, por razões de segurança nacional. Em conversa com o Director do estabelecimento, era afirmado que a capacidade está no limite, e, começa-se a temer a insegurança dentro das prisões. O crime aumenta a cada dia que passa.
Em suma, este é o pequeno retrato do mundo que vi. Hoje, mais 7 foram para Custóias em Prisão Preventiva.