Cada vez que leio mais sobre Auschwitz mais incrédulo fico com as atrocidades de todos aqueles que faziam parte do regime. Custa acreditar. Concluída a leitura de "Canção de embalar de Auschwitz", fica a ideia de que, mesmo no escuro e na imensidão da incerteza sobre um futuro inexistente, é possível oferecer resistência à falta de humanidade do outro. Helene Hannemann, enfermeira e ariana alemã, que teve 5 filhos com um cigano, foi enviada em 1943 para Auschwitz com a família. Uma distinta e admirável mulher que conseguiu criar esperança no pior sítio do mundo, ou seja, criar uma creche no meio do terror e da morte anunciada, e nunca deixou de lutar pelo direito das crianças: das suas e dos outros. Mas as atrocidades de Mengele (médico e oficial do regime nazi em Auschwitz) são algo impossível de deixar indiferente qualquer comum dos mortais (duvido da sanidade mental) . A descrição de algumas das suas experiências são inacreditáveis, a própria forma como abria pessoas e as cozia em carne viva incomoda os olhos de um leitor normal. Faz doer a alma pensar no sofrimento provocado de livre arbítrio. Helene quando o regime começou a perder poder viu as crianças da creche ficaram sem comida, começaram a escassear os recursos e fez tudo o que podia e não podia para inverter a situação. E perante isso, propuseram que ficasse livre, mas sem filhos e marido, por serem ciganos. A mesma nunca abdicou sua luta: não os abandonarei. Morreram todos nas câmaras de gás. Incrível o que esta mulher fez para humanizar ou evidenciar (por mínima que fosse) a possibilidade de existência de humanidade em pessoas do regime nazi, em prol de um bem comum e superior: as crianças.
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domingo, 22 de dezembro de 2019
quinta-feira, 12 de dezembro de 2019
Reino Unido: lugar inóspito?
Uma vitória inquestionável, mas previsível do Partido Conservador Britânico. Uma Europa, nomeadamente Bruxelas, que não soube e ainda não sabe lidar com os novos ventos partidários, porque habituaram-se aos comodismos da política caseira, sem olhar pela janela: uma janela aberta que permitiu semear o aparecimento de discursos heróicos, inspirados em fanatismos. Mas, um dos maiores contributos para a inexistência de discurso de oposição no Reino Unido chama-se Jeremy Corbyn, líder do partido trabalhista. Eu também (sendo contra o Brexit) não quereria Jeremy Corbyn se votasse no Reino Unido. Nem no parlamento. Como é possível ninguém ter conseguido vislumbrar o vazio de oposição ao longo destes anos e a falta de carisma perante um Boris carismático e com discurso ideológico, sem deixar cair principal bandeira: saída da União Europeia. Nisso tem mérito e ignorar a vitória eleitoral seria o pior. Boris venceu porque as pessoas votaram nele. E sejamos sinceros: já toda a gente estava farta desta indecisão política. Enquanto seu principal adversário nem sim nem sopas. Só que, os britânicos estão a navegar em águas europeias ainda, pensando que os problemas existentes se resolvem com a casa mais vazia. Os britânicos acreditam que os sucessivos e permanentes ataques terroristas, por exemplo, são criados pela imigração, e Boris soube capitalizar isso (uma nota: mas resolve-se o problema actual da imigração como? Aceitam-se os médicos, os advogados, as dentistas, os engenheiros, os enfermeiros, ou seja, as pessoas que auferem bons salários e que na óptica nacionalista, criarão bom ambiente e riqueza para o país, e manda-se embora as empregadas de limpeza, os ciganos, os empregados, os lixeiros, etc? O meu livro actual de horário nobre é "Canção de Embalar de Auschwitz", de Mário Escobar. Por vezes, parece que estou algures em 1938, pelo menos em discurso. Mas depois adormeço e tudo não passa de sonho. Quero acreditar nisso).
A única certeza: a 31 de Janeiro o Reino Unido sairá da União Europeia.
quarta-feira, 11 de dezembro de 2019
Ódio a Greta Thunberg
Greta Thunberg |
É impossível ficar indiferente a Greta Thunberg, seja pela negativa (no que ouvimos dos outros), seja pela positiva (no que ouvimos dela). Bem, acho que inqualificável ou censurável não chega para qualificar e adjectivar algumas declarações públicas proferidas acerca de Greta pelos principais líderes mundiais. Bolsonaro qualificou Gretha de "pirralha". Porque? Porque Gretha alertou, e bem, para a luta dos povos indígenas e demonstrou preocupação com o assassínio de líderes nativos no Brasil. Também Donald Trump gozou com Greta, entre outros tantos. Estas críticas são feitas a uma adolescente de 16 anos, que luta contra alterações climáticas, que é um dos maiores desafios actuais da humanidade: só. O destilar de ódio a que todos assistimos perante uma adolescente de 16 anos faz pensar como vai este mundo e os valores morais (em pleno declínio) que conseguimos alcançar ao fim de tantos anos de luta, muitos aqui já não estão.
quinta-feira, 5 de dezembro de 2019
Regime do Maior Acompanhado
Já passou algum tempo que entrou em vigor a lei do Regime do Maior Acompanhado, e parece que ainda existe muita falta de informação, o que é pena, porque estamos perante uma reforma civilizacional e um dos maiores avanços legislativos em Portugal. Hoje, é possível dizer que uma pessoa deficiente é igual a qualquer outra, e quantos eram os casos de familiares a pedir ao tribunal para declarar a pessoa incapaz de reger o seu património para que pudessem receber em nome delas, por exemplo, pensões e afins de natureza patrimonial. O mais perturbador é ouvir alguém de um serviço público (que tinha o dever de conhecer a lei) aconselhar uma pessoa idosa a falar com um familiar, porque terá de ser este a reger seu património, e que ela não poderá decidir nem poderá fazer nada. Isto é pouco aceitável, mas, pelos vistos, a falta de conhecimento estende-se a pessoas que têm obrigação e o dever de conhecer as alterações legislativas, sob pena de estarem aconselhar alguém erradamente, numa matéria de risco e tão sensível como esta. A lei mudou e ainda bem. Hoje, uma pessoa que se encontre impossibilitada de exercer, plena e conscientemente, os seus direitos ou cumprir seus deveres, pode requerer junto do tribunal as medidas de acompanhamento necessárias, sendo analisado caso a caso. E pode indicar quem cuidará de si se um dia precisar, o que é uma mudança radical e permite evitar situações claras de abuso por parte de familiares. Qualquer pessoa, mesmo que não tenha nenhuma doença, problema comportamental ou deficiência, pode, prevenindo uma eventual situação de acompanhamento, fazer uma espécie de declaração de vontade, que será um mandato, em qualquer cartório notarial. Há uma autonomia destas pessoas que não existia antes, daí ser grave ouvir pessoas aconselhar outras sob o regime antigo dos interditos e inabilitados.
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