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quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Testamento Vital: o direito de escolher

   

  







   Até que ponto vale a pena prosseguir com mais tratamentos quando a pessoa tem uma doença incurável, sem chances reais de sobrevivência?
   Em vigor a lei desde 1 de Julho, tem validade de 5 anos e basta preencher um simples formulário, de seu nome "testamento vital", onde urge a questão em saber qual a "morte digna" e se através do testamento vital é possível obtê-la. Será mesmo?
   Antes de qualquer palavra acerca do assunto, convém referir que o testamento vital é um documento onde qualquer cidadão pode deixar explícitos os tratamentos que querem ou se não querem ser tratados, no caso de doença terminal ou incurável ou perante um diagnóstico de inconsciência por doença neurológica ou psiquiatra irreversível, tendo de expressar uma vontade livre, consciente e esclarecida.
   Olhando para os números (e porque ao falar de números estamos a falar de pessoas), em 1 mês, 135 pessoas expressaram os tratamentos que pretendem ou não receber em caso de doença e em 2 meses mais de 200 expressaram a sua vontade no RENTEV (Registo Nacional do Testamento Vital).
   É um assunto delicado, onde o meu primeiro grande debate teve lugar numa aula de Mundividência Cristã, com o ilustre Padre Manuel Linda, de quem guardo boas recordações e saudade da pessoa. Lembro-me do começo da discussão: como podemos ter uma vontade livre, consciente e esclarecido de algo ou assunto médico que não dominamos, ou não podermos saber se no momento é o mais apropriado? 
    Nesse primeiro debate, como religioso que sou, sempre tive reticências relativamente a podermos decidir sobre o momento da morte, mas pode ser interpretado de outra forma: evitar ser submetido a algo que possa fazer sofrer a pessoa e que seja irreversível, mas que pode ser respondido da seguinte forma: então a medicina hoje não tem fármacos que impossibilitam na totalidade a pessoa de sofrer? A dor parece-me um dos busílis da questão, saber se o doente sofre ou não, consciente da sua sentença de morte.
 Acho que este como outros assuntos delicados, não há nada como estar de perto ou presenciar casos de pessoas que, por exemplo, têm ser submetidas a medidas de alimentação artificial que visam apenas retardar a morte. E aqui, quando percebi e presenciei isso, percebi que do outro lado, mesmo podendo ou não concordar, não estava algo "sem pés nem cabeça", pelo contrário, estava algo que olhava precisamente para esses casos, de pessoas que ficam acamadas, com doença irreversível, em estado puramente artificial, esperando pela morte já anunciada. 
   Outra das questões é saber como comprovar que a pessoa se encontra num quadro em que a recuperação é impossível. É que os elementos envolvidos no caso são pessoas, e, o testamento vital visa a preservação da vida bem como dar a possibilidade à pessoa de poder decidir como viver quando a vida está a terminar. 
      Se olharmos para a lei n.º25/2012, de 16 de Julho (mas só com regulamentação este ano publicada desde Julho de 2014), hà coisas com quais concordo e outras com as quais discordo. Concordo, por exemplo, em uma pessoa declarar que pessoa quer perto de si e que tipo de assistência religiosa quer receber quando forem interrompidos meios artificiais de vida. Concordo com a recusa de tratamentos considerados "desproporcionais" dos quais não haverá melhorias ou até podem trazer sofrimento. Concordo com a recusa de fármacos que possam levar a situações de dores ou causar padecimento ou molestar ou até de medidas de alimentação e hidratação artificiais apenas para retardar o processo natural de morte. Não concordo, por exemplo, com a não autorização de administração de sangue ou derivados. Mas volto a referir que quando me perguntam se concordo é difícil ter uma posição literal, quando cada caso é um caso, e, hà coisas na lei que concordo, outras não, o que torna difícil ter uma posição base sobre um assunto que de "base justificativa" tem pouco, podendo cair na teia das várias teses em confronto. Mas é importante sublinhar que, parece-me que este diploma respeita a pessoa humana, e cabe a cada um fazer o seu juízo de prognose, não utilizando este mecanismo de livre arbítrio (livre arbítrio segundo Santo Agostinho, que o definia como a possibilidade de escolher entre o bem e o mal).