Em 1836, as touradas foram proibidas em Portugal, durante o reinado de Dona Maria II, por serem consideradas um divertimento bárbaro e impróprio das nações civilizadas, que seria unicamente para habituar os homens ao crime e à ferocidade. Como é que hoje, em 2015, ainda é permitido este espectáculo/tradição em mais de 100 municípios nacionais? Será que faz parte do património cultural português?
As touradas dividem opiniões e dividem gerações. Por um lado, há quem sustente tal espectáculo pela tradição, pelo costume das terras, ignorando por completo o animal em si mesmo, antes instrumentalizando-o para o espectáculo. Por outro lado, e cada vez mais, são aqueles que defendem que deviam ser abolidas as touradas, pelo sofrimento e maus tratos causados ao animal.
Em 2011, a Federação Portuguesa das Associações Taurinas apresentou na Assembleia da República, na Comissão de Educação Ciência e Cultura, um documento onde apresentava a importância das touradas no nosso país. No início do documento sustentam a posição de ser a favor das corridas de toiros com o argumento de que ao destruírem a Tauromaquia, destroem um símbolo da superioridade da humanidade sobre a animalidade. No documento, defendem que não é tortura, dizendo que "torturar é fazer sofrer um ser que não se pode defender, com o proposito de tirar um benefício sem qualquer risco. As corridas de toiros dão um duelo, um combate onde o toiro deve lutar e mostrar a sua natureza e o homem só pode aceitar participar nesse combate se aceitar pôr a sua vida em risco, não sendo comparável com a verdadeira tortura, como a que sofre, por exemplo, o prisioneiro político". Também negam que pode ser considerado uma bárbarie porque isso "pressupõe algo sem regras, sem educação, rude. Ora, a Corrida de Toiros é um ritual, perfeitamente regulado, onde cada gesto, cada passo, cada atitude tem um significado preciso e valorado. Nada tem, por isso,de bárbaro nem se compara com as verdadeiras barbaridades, como o assassínio ou mutilação indiscriminada de homens, mulheres e crianças que ainda hoje acontecem". É afirmado que a "Corrida de Toiros é,também, de uma riqueza estética inestimável, pois o toureiro cria beleza através de uma dança com a morte, transformando a natureza bruta, a linha recta, o movimento incontrolável, em curvas poéticas e temporizadas. E, a todas as outras artes, o toureio acrescenta esta dimensão única da verdade, da autenticidade, da realidade. Na Corrida de Toiros, a vida é sublimada porque, precisamente, ela pode aí ser tirada". Defendem que "a Corrida de Toiros é, antes de mais e sobretudo, uma Festa. A nossa época, mais do que qualquer outra, precisa de festas. A nossa modernidade faz-nos cada vez mais individualistas, fechados sobre nós próprios, no trabalho ou em casa. Vivemos assoberbados por esta necessidade de cumprir obrigações, de respeitar códigos e regras, sobrando-nos muito pouco tempo para estarmos com a família, e menos ainda para nos inserirmos na comunidade
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muitos já só o fazem através de redes sociais. E é na festa que muitos dos membros da comunidade têm essa hipótese de interagirem entre si, de se reencontrarem, porque a festa se faz na rua, em público, em conjunto".
Na minha opinião, a manutenção deste espectáculo e tradição em volta do culto do toiro faz-me regredir na evolução dos tempos, aos tempos negros da humanidade, em que homens e animais se confrontavam numa arena para gáudio de milhares de espectadores e não poder aceitar uma tradição que nasceu e cresceu nesses tempos onde também era permitido esquartejar pessoas, e, onde queimavam-se pessoas em volta de rituais e tradições, onde o povo assistia e gostava do que via. Os argumentos utilizados pelos protoiro são discutíveis e pouco sustentáveis. Um dos primeiros argumentos é a demonstração da superioridade humana sobre a natureza animal,defendendo que não é tortura, porque é um duelo. Esta posição é pouco sustentável, porque, hoje em dia, em primeiro, já não existe essa ideia de superioridade humana sobre a natureza animal como existiu em tempos arcaicos da nossa história e, depois, os espectáculos acontecem em praças de toiros onde o toiro é completamente dominado e não tem sequer hipótese de se defender, sendo cercado e limitado. A prova disso é ver o famoso espectáculo de Pamplona onde soltam os toiros e estes chegam mesmo a ferir e matar pessoas, o que raramente acontece numa praça de toiros, pois aqui ele está cercado e limitado nos seus movimentos, levando com bandarilhas, que lhe ferem e causam dor. Os protorios afirmam também que a corrida de toiros é de uma estética inestimável porque toureiro cria riqueza através da dança com a morte. Isto é uma defesa filosófica, que pouco tem de discussão, pois pode ter sempre defesa, porque apoia-se na abstração ou subjetividade. Mas quando a defesa de tal espectáculo se sustenta na riqueza da morte de um animal é algo preocupante e que deve ser censurada. Também chegam afirmar que é uma "festa", com a qual ninguém discorda, mas dizer que o povo necessita deste tipo de festas para interagir entre si é exagerado, porque são muitos aqueles que são contra as touradas e cada vez menos os que são a favor. E já foi mais uma prática popular do que é hoje, porque já foi o tempo em que as corridas de toiros pertenciam à plebe, sendo hoje festas também da nobreza, onde o espetáculo é mais arrojado (feito em praças com requinte) , deixando de ser um exclusivo popular, como ainda muitos tencionam fazer valer. Defender as touradas é defender os maus tratos a animais, e, pactuar com um espectáculo que é arcaico e nos faz remontar aos tempos mais negros da história da humanidade, onde a morte na arena é aplaudida e incentivada pela plateia que assiste. Hoje, embora no código civil ainda sejam consideradas coisas, já existe mais respeito pelos animais e o respeito pelo seu sofrimento começa a fazer parte de uma forma de pensar de muitas gentes.