Resolução da Assembleia da República n.º 22-A/2020
Sumário: Autorização da renovação do estado de emergência.
Autorização da renovação do estado de emergência
A Assembleia da República resolve, nos termos da alínea l) do artigo 161.º e do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição e do n.º 1 do artigo 15.º e do n.º 1 do artigo 23.º da
Lei n.º 44/86, de 30 de setembro, alterada e republicada pela
Lei Orgânica n.º 1/2012, de 11 de maio, conceder autorização para a renovação do estado de emergência, solicitada por S. Ex.ª o Presidente da República, na mensagem que endereçou à Assembleia da República em 1 de abril de 2020, nos exatos termos e com a fundamentação e conteúdo constantes do projeto de Decreto do Presidente da República:
1.º
É renovada a declaração do estado de emergência, com fundamento na verificação de uma continuada situação de calamidade pública.
2.º
A declaração do estado de emergência abrange todo o território nacional.
3.º
A renovação do estado de emergência tem a duração de 15 dias, iniciando-se às 0:00 horas do dia 3 de abril de 2020 e cessando às 23:59 horas do dia 17 de abril de 2020, sem prejuízo de eventuais novas renovações, nos termos da lei.
4.º
Fica parcialmente suspenso o exercício dos seguintes direitos:
a) Direito de deslocação e fixação em qualquer parte do território nacional: podem ser impostas pelas autoridades públicas competentes as restrições necessárias para reduzir o risco de contágio e executar as medidas de prevenção e combate à epidemia, incluindo o confinamento compulsivo no domicílio, em estabelecimento de saúde ou noutro local definido pelas autoridades competentes, o estabelecimento de cercas sanitárias, assim como, na medida do estritamente necessário e de forma proporcional, a interdição das deslocações e da permanência na via pública que não sejam justificadas, designadamente pelo desempenho de atividades profissionais, pela obtenção de cuidados de saúde, pela assistência a terceiros, pela produção e pelo abastecimento de bens e serviços e por outras razões ponderosas, cabendo ao Governo, nesta eventualidade, especificar as situações e finalidades em que a liberdade de circulação individual, preferencialmente desacompanhada, se mantém;
b) Propriedade e iniciativa económica privada: pode ser requisitada pelas autoridades públicas competentes a prestação de quaisquer serviços e a utilização de bens móveis e imóveis, de unidades de prestação de cuidados de saúde, de estabelecimentos comerciais e industriais, de empresas e outras unidades produtivas, assim como pode ser determinada a obrigatoriedade de abertura, laboração e funcionamento de empresas, serviços, estabelecimentos e meios de produção ou o seu encerramento e impostas outras limitações ou modificações à respetiva atividade, incluindo limitações aos despedimentos, alterações à quantidade, natureza ou preço dos bens produzidos e comercializados ou aos respetivos procedimentos e circuitos de distribuição e comercialização, designadamente para efeitos de aquisição centralizada, por ajuste direto, com caráter prioritário ou em exclusivo, de estoques ou da produção nacional de certos bens essenciais, bem como alterações ao regime de funcionamento de empresas, estabelecimentos e unidades produtivas; podem ser adotadas medidas de controlo de preços e combate à especulação ou ao açambarcamento de determinados produtos ou materiais; podem ser temporariamente modificados os termos e condições de contratos de execução duradoura ou dispensada a exigibilidade de determinadas prestações, bem como limitado o direito à reposição do equilíbrio financeiro de concessões em virtude de uma quebra na respetiva utilização decorrente das medidas adotadas no quadro do estado de emergência; pode ser reduzida ou diferida, sem penalização, a perceção de rendas, juros, dividendos e outros rendimentos prediais ou de capital;
c) Direitos dos trabalhadores: pode ser determinado pelas autoridades públicas competentes que quaisquer colaboradores de entidades públicas, privadas ou do setor social, independentemente do tipo de vínculo, se apresentem ao serviço e, se necessário, passem a desempenhar funções em local diverso, em entidade diversa e em condições e horários de trabalho diversos dos que correspondem ao vínculo existente, designadamente no caso de trabalhadores dos setores da saúde, proteção civil, segurança e defesa e ainda de outras atividades necessárias ao tratamento de doentes, ao apoio a populações vulneráveis, pessoas idosas, pessoas com deficiência, crianças e jovens em risco, em estruturas residenciais, apoio domiciliário ou de rua, à prevenção e combate à propagação da epidemia, à produção, distribuição e abastecimento de bens e serviços essenciais, ao funcionamento de setores vitais da economia, à operacionalidade de redes e infraestruturas críticas e à manutenção da ordem pública e do Estado de Direito democrático, podendo ser limitada a possibilidade de cessação das respetivas relações laborais ou de cumulação de funções entre o setor público e o setor privado. Pode ser alargado e simplificado o regime de redução temporária do período normal de trabalho ou suspensão do contrato de trabalho por facto respeitante ao empregador. Fica suspenso o direito das comissões de trabalhadores, associações sindicais e associações de empregadores de participação na elaboração da legislação do trabalho, na medida em que o exercício de tal direito possa representar demora na entrada em vigor de medidas legislativas urgentes para os efeitos previstos neste Decreto. Fica suspenso o exercício do direito à greve na medida em que possa comprometer o funcionamento de infraestruturas críticas, de unidades de prestação de cuidados de saúde e de serviços públicos essenciais, bem como em setores económicos vitais para a produção, abastecimento e fornecimento de bens e serviços essenciais à população;
d) Circulação internacional: podem ser estabelecidos pelas autoridades públicas competentes, em articulação com as autoridades europeias e em estrito respeito pelos Tratados da União Europeia, controlos fronteiriços de pessoas e bens, incluindo controlos sanitários e fitossanitários em portos e aeroportos, com a finalidade de impedir a entrada em território nacional ou de condicionar essa entrada à observância das condições necessárias a evitar o risco de propagação da epidemia ou de sobrecarga dos recursos afetos ao seu combate, designadamente impondo o confinamento compulsivo de pessoas em local definido pelas autoridades competentes. Podem igualmente ser tomadas as medidas necessárias a assegurar a circulação internacional de bens e serviços essenciais;
e) Direito de reunião e de manifestação: podem ser impostas pelas autoridades públicas competentes, com base na posição da Autoridade de Saúde Nacional, as restrições necessárias para reduzir o risco de contágio e executar as medidas de prevenção e combate à epidemia, incluindo a limitação ou proibição de realização de reuniões ou manifestações que, pelo número de pessoas envolvidas, potenciem a transmissão do novo Coronavírus;
f) Liberdade de culto, na sua dimensão coletiva: podem ser impostas pelas autoridades públicas competentes as restrições necessárias para reduzir o risco de contágio e executar as medidas de prevenção e combate à epidemia, incluindo a limitação ou proibição de realização de celebrações de cariz religioso e de outros eventos de culto que impliquem uma aglomeração de pessoas;
g) Liberdade de aprender e ensinar: podem ser impostas pelas autoridades públicas competentes as restrições necessárias para reduzir o risco de contágio e executar as medidas de prevenção e combate à epidemia, incluindo a proibição ou limitação de aulas presenciais, a imposição do ensino à distância por meios telemáticos (com recurso à Internet ou à televisão), o adiamento ou prolongamento de períodos letivos, o ajustamento de métodos de avaliação e a suspensão ou recalendarização de provas de exame ou da abertura do ano letivo, bem como eventuais ajustes ao modelo de acesso ao ensino superior;
h) Direito à proteção de dados pessoais: as autoridades públicas competentes podem determinar que os operadores de telecomunicações enviem aos respetivos clientes mensagens escritas (SMS) com alertas da Direção-Geral da Saúde ou outras relacionadas com o combate à epidemia.
5.º
Fica impedido todo e qualquer ato de resistência ativa ou passiva exclusivamente dirigido às ordens legítimas emanadas pelas autoridades públicas competentes em execução do presente estado de emergência, podendo incorrer os seus autores, nos termos da lei, em crime de desobediência.
6.º
Podem ser tomadas medidas excecionais e urgentes de proteção dos cidadãos privados de liberdade em execução de decisão condenatória, bem como do pessoal que exerce funções nos estabelecimentos prisionais, com vista à redução da vulnerabilidade das pessoas que se encontrem nestes estabelecimentos à doença COVID-19.
7.º
1 - Os efeitos da presente declaração não afetam, em caso algum, os direitos à vida, à integridade pessoal, à identidade pessoal, à capacidade civil e à cidadania, à não retroatividade da lei criminal, à defesa dos arguidos e à liberdade de consciência e religião.
2 - Os efeitos da presente declaração não afetam igualmente, em caso algum, as liberdades de expressão e de informação.
3 - Em caso algum pode ser posto em causa o princípio do Estado unitário ou a continuidade territorial do Estado.
4 - Nos termos da lei, a Procuradoria-Geral da República e a Provedoria de Justiça mantêm-se em sessão permanente.
8.º
Os órgãos responsáveis, nos termos da
Lei n.º 44/86, de 30 de setembro, pela execução da declaração do estado de emergência devem manter permanentemente informados o Presidente da República e a Assembleia da República dos atos em que consista essa execução.
9.º
São ratificadas todas as medidas legislativas e administrativas adotadas no contexto da presente crise, as quais dependam da declaração do estado de emergência.
10.º
A presente resolução entra em vigor com o Decreto do Presidente da República, produzindo efeitos nos mesmos termos.
Aprovada em 2 de abril de 2020.
O Presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues.